quarta-feira, 16 de janeiro de 2013

Nos "top ten"! 2012 desafia La Niña e entra para a lista dos mais quentes!

Evolução das anomalias de temperatura ao longo do ano
para 2012, em comparação com os cinco anos mais quentes
do registro histórico. Fonte: http://www.ncdc.noaa.gov/sotc
Um ano que começou com um evento de La Niña, no Pacífico, como 2012, deveria ter sido marcado por temperaturas relativamente mais baixas. Foi o que aconteceu, como se pode perceber na Figura ao lado, no início do ano. No entanto, o que se pode perceber é que, com o enfraquecimento e desaparecimento desse fenômeno, as temperaturas globais rapidamente subiram, e 2012 se aproximou dos anos mais quentes do registro histórico.

2012 encerrou como o décimo mais quente desse registro, iniciado em 1880, 0,57°C acima da média histórica. É o 36º ano consecutivo em que as temperaturas globais ficaram mais quentes do que essa média (de 1977 para cá). Se você tem 36 anos de idade ou menos, portanto, você não teve oportunidade de viver um ano sequer de sua vida em que as temperaturas globais estivessem abaixo do "normal". 


Anomalias de Temperatura média global, desde 1950, em
que foram separados os anos de El Niño (vermelho), neutros
(cinza) e de La Niña (azul). Fonte: http://www.ncdc.noaa.gov/sotc
Sabemos que o clima terrestre possui variabilidade natural, além do efeito humano, então uma boa coisa a fazer, se quisermos aprofundar nossa análise é separar os anos de El Niño dos anos de La Niña e dos anos em que o Oceano Pacífico permaneceu "neutro" (isto é, sem La Niña nem El Niño) Se considerarmos somente os anos de ocorrência de La Niña, marcados em azul no gráfico ao lado, algumas coisas são percebidas de imediato. Primeiro, que 1976, o último ano mais frio que a média histórica, foi um ano de La Niña. Segundo, que houve uma tendência de aquecimento praticamente contínua ao longo desses anos e que boa parte das flutuações que ocorrem entre um ano e o ano seubsequente se dão em função da alternância de eventos de El Niño, La Niña e neutros. Por último, também é perfeitamente notável o fato de que 2012 foi o ano de La Niña mais quente de todo o registro histórico. É, portanto, o único ano de La Niña a figurar na lista dos 10 anos mais quentes desde que esse registro se iniciou (2008 e 2011, anos de La Niña mais recentes, não chegaram a posição tão "honrosa". O gráfico deixa evidente também que 3 dos 4 anos mais quentes de todo o registro histórico foram os anos de El Niño mais recentes (1998, 2003 e 2010). Alguma dúvida de que o próximo ano de El Niño será um forte candidato a recordista absoluto de temperaturas médias globais?

2012 foi também, como já relatamos em outros momentos neste blog, um ano de extremos, do degelo do Ártico aos incêndios florestais nos EUA (sobre cujo território 2012 foi o ano mais quente de todo o registro); dos poderosos furacões Isaac e Sandy e do supertufão Bopha à onda de calor que se abateu sobre o Rio de Janeiro.

Irradiância Solar Total de 1978 a 2012, conforme o Physikalisch-
Meteorilogisches Observatorium Davos / World Radiation Center. 
Fonte:
http://www.pmodwrc.ch/pmod.php?topic=tsi/composite/SolarConstant
Além da ocorrência do fenômeno La Niña, outra possível influência natural sobre a temperatura média global seria a variabilidade solar. No entanto, como mostra a figura ao lado, em 2012 apenas se iniciou a recuperação da TSI (ou irradiância solar total, que é a quantidade de energia por unidade de área por unidade de tempo incidente num ponto do topo da atmosfera terrestre diretamente voltado para o Sol). Como se percebe no gráfico, a atividade solar oscila, mas 2012 está bastante distante dos anos de maior incidência de radiação solar. Devemos frisar, como discutido em textos neste blog, o papel do Sol é bastante pequeno, mas neste caso, se existisse, a contribuição da redução na TSI seria no sentido de resfriar o planeta nos últimos anos. 

Evolução da concentração de CO2 atmosférico desde
o final da década de 1950 até o presente. A linha vermelha
representa dados mensais e a linha preta, médias anuais.
Fonte: http://www.esrl.noaa.gov/gmd/obop/mlo/
A razão de 2012 ter sido um ano de temperaturas tão altas e com eventos extremos a granel, mesmo com uma La Niña e com o Sol com baixa atividade é absolutamente clara. Especialmente se os tanto as condições oceânicas quanto a atividade solar estavam contribuindo para que 2012 fosse um ano mais frio do que o normal, a atribuição recai sobre as elevadas concentrações de gases de efeito estufa. Particularmente no caso do CO2, principal produto da queima de combustíveis fósseis (petróleo, carvão e gás natural), sua concentração média atingiu 393,84 ppm. Isto é cerca de 41% acima de um valor que permaneceu estável por quase 10 mil anos até o advento da era industrial. É 25% a mais do que em 1959 (primeiro ano completo de medições das concentrações desse gás em Mauna Loa). É quase 7% a mais desde que se iniciou o século XXI! A figura acima não deixa dúvidas sobre o crescimento acelerado da presença desse gás na atmosfera. Esse aumento de concentração de CO2 em relação ao período pré-industrial implica em uma forçante radiativa (isto é a uma energia extra por unidade de área por unidade de tempo) de 1,83 W/m2, o que é muito maior do que a contribuição solar. Basta ver que, na figura de Irradiância Solar Total, é indicado que o ciclo solar de maior amplitude dentre os 3 últimos levou a uma variação de 1,055 W/m2, entre o máximo e o mínimo, o que leva a uma contribuição solar de apenas 0,18 W/m2 (resultado da divisão por 4, que é a razão entre as áreas de uma esfera e de um disco de mesmo raio e da multiplicação por 0,7, para descontar o albedo, isto é a fração da energia solar que é refletida diretamente para o espaço e, portanto, não é utilizada no sistema climático terrestre), ou seja, 10 vezes menor do que a do CO2, sem considerar os demais gases de efeito estufa emitidos pelas atividades humanas (metano, óxido nitroso e halocarbonetos).

A temperatura global é resultado da sobreposição de efeitos naturais e antrópicos, mas está ficando cada vez mais claro que a influência humana já é mais importante do que a variabilidade climática natural. Usando termos típicos das ciências que utilizam análise estatística, o "sinal" humano emerge claramente do "ruído" da Natureza. Mas eu prefiro, neste caso, usar outros termos, menos científicos: é a gritaria enlouquecedora das atividades humanas que ressoa mais alto que a harmonia dos ciclos naturais. E assim será, cada vez mais, a não ser que marchemos, aceleradamente, para o abandono dos combustíveis fósseis.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Copo "meio cheio" não salva uma casa em chamas

Alok Sharma, presidente da COP26, teve de conter as lágrimas no anúncio do texto final da Conferência, com recuo em tópicos essenciais "...

Mais populares este mês