quarta-feira, 28 de novembro de 2012

Não dá para Tapar o Sol... Digo, os Gases de Efeito Estufa, com uma Peneira!

O Sol é, como todos sabemos, a fonte primária de energia para o sistema climático da Terra e de todos os demais planetas que o orbitam. Mas a quantidade de energia que chega a um planeta é apenas um dos fatores que determinam o seu clima.


Cerca de 30% da luz solar que chega à Terra é simplesmente devolvida ao espaço, por ser refletida especialmente pelas nuvens que sempre cobrem parte do nosso planeta e por superfícies claras (como a areia dos desertos e, principalmente, o gelo das calotas). Os 70% restantes são absorvidos pelo solo, pelas florestas e demais tipos de vegetação, mas principalmente pelos oceanos, que ocupam 71% da superfície do planeta e refletem pouca luz. Essa energia absorvida aquece o planeta e, como todo objeto, a Terra passa a emitir ondas eletromagnéticas cujas características dependem da temperatura. Nas temperaturas típicas da Terra, o próprio planeta, nós e os objetos ao nosso redor irradiamos na faixa do infravermelho. Assim como a luz, o infravermelho é uma onda eletromagnética, mas de frequência de oscilação mais baixa e “comprimento de onda” mais longo. Ele não é detectado por nossos olhos (que também não nos permitem enxergar nem ondas de rádio, nem ultravioleta, nem raios X, dentre tantas outras radiações de onda mais longa ou mais curta do que a luz visível), mas nas tragédias das guerras é o que permite que mísseis persigam seus alvos (como aeronaves) e que, com o auxílio de óculos específicos, soldados possam ver outras pessoas e veículos, mesmo na completa escuridão. Quanto mais quente o objeto, mais infravermelho é emitido, mais alta é a frequência e mais curto é o comprimento de onda. 


Modos de vibração de uma
molécula de CO2. Fonte:
http://chemwiki.ucdavis.edu/
    
Se a historinha parasse por aí, com a Terra recebendo luz visível e emitindo infravermelho diretamente da sua superfície para o espaço, não teríamos o planeta belo e acolhedor no qual evoluíram todas as formas de vida, incluindo nossa espécie. A temperatura média da superfície da Terra seria de gélidos -18°C, ao invés de aprazíveis 15°C. E isso acontece não somente porque nosso planeta tem uma atmosfera, mas porque existem mais coisas entre o espaço e a Terra do que moléculas de Nitrogênio e Oxigênio (que respondem, respectivamente, por 78% e 21% do ar que respiramos). Na verdade, alguns gases, bastante minoritários em nossa atmosfera (principalmente vapor d’água e dióxido de carbono, ou CO2) possuem 3 ou mais átomos na molécula e, por isso, têm uma propriedade: a de absorver infravermelho. Isso faz toda a diferença! A Figura ao lado mostra como uma molécula de CO2 pode vibrar de diferentes maneiras.

É possível que gases que constituem uma fração tão minoritária possam influenciar o clima? A resposta é sim! A interação entre certas moléculas e determinadas frequências de radiação eletromagnética faz mais parte do cotidiano do que se imagina. Num forno de micro-ondas, nem todas as moléculas absorvem as ondas eletromagnéticas que oscilam na frequência de 2450 MHz (dois bilhões e meio de oscilações por segundo). Inicialmente, são as moléculas da água que absorvem a grande maioria da energia das micro-ondas, mas ao fazê-lo, estas se aquecem, sendo o calor então repassado a todo o alimento.

A Figura abaixo mostra o que acontece, portanto, quando um planeta é recoberto por uma atmosfera que contenha mesmo pequenas frações dos chamados gases de efeito estufa. A Terra absorve parte da luz solar que chega e emite infravermelho. Devido a esses gases, parte desse infravermelho não passa diretamente para o espaço, sendo absorvido na atmosfera, que também se aquece. A atmosfera, então, passa a emitir infravermelho para cima (ou seja, enviando mais infravermelho para o espaço), mas também emite infravermelho para baixo, devolvendo energia para a superfície da Terra. Esta, portanto, se torna mais quente do que seria sem a presença desses gases na atmosfera do planeta. O fato de parte do calor ser aprisionado, como numa estufa, é que deu o nome a esse fenômeno, cuja existência foi prevista por Joseph Fourier em 1824 e observado experimentalmente por John Tyndall, 35 anos depois. Svante Arrhenius, em 1896 foi o primeiro cientista ao apresentar estimativas quantitativas da influência desse efeito sobre o clima da Terra. Na figura, os valores numéricos estão em Watts por metro quadrado, ou W/m2 (por exemplo, os 342 W/m2 de luz solar que chegam em média à Terra, equivalem a 17 lâmpadas fluorescentes de 20 W cada, dispostas em uma área de um metro quadrado, ou a uma batedeira , na mesma área, ou ainda a um ferro de passar de pouco menos de 1400W em uma área de 2m por 2m).

Balanço radiativo e energético da Terra. Fonte: http://www.ipcc.ch/publications_and_data/ar4, a partir de   Kiehl, J., e K. Trenberth, 1997: Earth’s annual global mean energy budget. Bull. Am. Meteorol. Soc., 78, 197–206.

Evolução da concentração de
Dióxido de Carbono, Metano
e Óxido Nitroso nos últimos
10 mil anos ("zoom" nos últimos
300 anos) e a forçante radiativa
associada. Fonte: IPCC 
A estabilidade climática, como se vê pela Figura acima, existe quando a quantidade de energia solar que chega à Terra (235 W/m2, já descontando o que é refletido) é balanceada pelo infravermelho emitido para o espaço (mesmo valor). Este número é uma fração (cerca de 60%) do infravermelho emitido pela superfície (390 W/m2), já que parte deste é “interceptado” pela atmosfera.

Ora, o que se deve esperar ao se aumentar a proporção de gases de efeito estufa na atmosfera terrestre? Uma fração menor da radiação emitida pela superfície passaria pela atmosfera. Para que o infravermelho emitido ao espaço continuasse balanceando a luz solar e apenas metade da radiação terrestre passasse (ao invés de 60%), seriam necessários 470 W/m2 e não mais 390. Mas isto só seria possível se a superfície estivesse mais quente, ou, para ser mais exato, a uma temperatura 13 graus acima da do clima presente!    

Mas é exatamente o aumento desses gases na atmosfera terrestre, o que se tem observado! As proporções de dióxido de carbono (CO2), metano (CH4) e óxido nitroso (N2O) tem  crescido vertiginosamente desde o início da era industrial e esse aumento casa perfeitamente com o aquecimento observado do sistema climático terrestre desde então, como mostramos no início deste texto. A Figura acima mostra como as concentrações destes gases (em partes por milhão em volume, ou ppm, no caso do CO2 e em partes por bilhão, ou ppb, no caso dos demais gases) mudaram nos últimos 10 mil anos (com “zoom” nos últimos 300 anos) e qual a “forçante radiativa”, uma medida da energia aprisionada no sistema terrestre em função do aumento da concentração desses gases. Em 2005, a estimativa era de que o aumento do CO2 na atmosfera (cuja concentração então era de 379 partes por milhão e hoje em dia ultrapassou 390) já contribuía para aquecer a Terra com uma forçante de +1,66 W/m2 (com pequena incerteza para mais ou para menos) um valor bastante significativo para o aquecimento do sistema climático terrestre. Os demais gases de efeito estufa (o que inclui também os halocarbonetos) entram com algo muito próximo de 1 W/m2 a mais.

Temperatura (em vermelho) e atividade solar (em azul) desde 

o final do século XIX, com as linhas mais grossas eliminando 

o ciclo de 11 anos. Fonte: http://www.skepticalscience.com/solar-
de http://data.giss. nasa.gov/gistemp/tabledata/GLB.Ts+dSST.txt 
data.html (Irradiância solar total). 


A dimensão da forçante radiativa dos gases de efeito estufa, por sinal, é grande o suficiente para suplantar quaisquer efeitos naturais. O Sol, por exemplo, tem um ciclo bem conhecido de 11 anos, durante o qual a energia que ele lança para o espaço varia em 0,1%, o que, do ponto de vista do clima terrestre, significa uma forçante radiativa de 0,24 W/m2. Considerando um período de longo prazo, as estimativas são de que as mudanças na atividade solar desde o período conhecido como “mínimo de Maunder”, no século XVII até hoje têm contribuído com quase zero (isso mesmo!) a, na estimativa maior, +0,68 W/m2, como mostrado em http://www.ipcc.ch/publications_and_data/ar4/wg1/en/ch2s2-7-1-2.html. Percebam que, baseando-se nos especialistas que estudam a Física do Sol, o IPCC não poderia fazer outra coisa a não ser atribuir às variações de atividade solar uma forçante radiativa de aquecimento bastante modesta, de poucos décimos de W/m2. Chegamos à conclusão inevitável de que a contribuição da variabilidade solar para o clima desde o século XVII é várias vezes menor do que a dos gases de efeito estufa. Considerando estimativas a partir do século XVIII (e não XVII), fica mais claro que o papel do Sol é ainda menos significativo (forçante radiativa estimada de apenas +0,12 W/m2). A Figura acima, com destaque para curvas em que o ciclo de 11 anos foi eliminado, as variações de temperatura e irradiância solar total desde 1880 até o início do século XXI. Ela sugere que o Sol pode ter contribuído para o aquecimento verificado no início do século XX. Porém, especialmente a partir da década de 1970, a atividade solar entrou em declínio e portanto não há relação possível entre o comportamento do Sol e o aquecimento pronunciado, observado no sistema climático terrestre desde então.

Isótopos do Carbono, todos com 6 prótons: Carbono 12, ou 

12C, com 6 nêutrons, 13C, com 7 e 14C, com 8. Este último 

é radioativo, isto é, instável.
A outra questão fundamental diz respeito à origem desses gases que têm se acumulado na atmosfera terrestre. Como saber, por exemplo, se o aumento de CO2 atmosférico se deve a atividades humanas e não a causas naturais? A resposta está nos chamados isótopos, isto é, átomos do mesmo elemento químico que diferem entre si pelo número de nêutrons no núcleo e, portanto, tem massa distintas. No caso, é dada pelos isótopos do carbono, mostrados na Figura ao lado: 12C, de longe o mais abundante, 13C, um primo “pesado”, mas estável e o 14C, que é instável (radioativo) e, portanto, se desintegra. Sua proporção nos tecidos orgânicos mortos diminui a um ritmo constante com o passar do tempo, o que permite que este seja usado em datação. Numa amostra de 14C, metade dos átomos se desintegra a cada 5730 anos.

Quando as plantas realizam fotossíntese, absorvem CO2 da atmosfera, mas dão “preferencia” às moléculas contendo o isótopo leve, isto é, 12C, que difundem mais rápido e chegam antes ao interior das células. Ao final, as plantas contém uma proporção menor de 13C do que a atmosfera e, como 12C e 13C são estáveis, essa proporção é mantida quando o vegetal morre.


Os combustíveis fósseis, isto é, carvão, petróleo e gás natural provêm de plantas que morreram há milhões de anos e, portanto, também contém uma proporção menor de 13C do que a atmosfera. À medida que o CO2 na atmosfera tem aumentado de forma constante, a sua composição isotópica mudou na mesma proporção. Hoje, a proporção de moléculas desse gás contendo 13C diminuiu na exata proporção esperada pela queima de matéria de origem vegetal. A resposta é dada pelo “primo” radioativo, o 14C. Os combustíveis fósseis, sendo de milhões de anos de idade, não tem nenhum C14. Adicionando carbono antigo deveria ter reduzido a proporção de C14 na atmosfera, e de fato reduziu. Durante os últimos 50 anos, enquanto a quantidade de carbono na atmosfera tem aumentado, a proporção de C14 diminuiu progressivamente.

Neste crime (aquecimento global), o exame de balística mostrou qual é a arma (gases de efeito estufa, principalmente CO2) e havia impressões digitais dos criminosos, isto é, dos combustíveis fósseis. Estão esperando o que para deixá-los presos?

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