"Anomalia" de temperatura de 1880 a 2011.
Fonte: National Oceanic and Atmospheric Administration (NOAA), disponível em http://www.ncdc.noaa.gov. |
Não há mais margem para dúvidas: o sistema climático
terrestre está aquecendo. Registros de estações meteorológicas se tornaram
regulares a partir do final do século XIX, pouco depois, portanto, do advento
da era industrial. Nos últimos 100 anos, em média, a superfície do planeta já
aqueceu em cerca de 1°C, como se pode ver na Figura ao lado. Esta figura mostra a
chamada “anomalia” de temperatura, isto é, a diferença entre a temperatura
observada e a média do século XX, com os três gráficos se referindo
respectivamente à média global (acima), à média sobre os oceanos (no meio) e
sobre os continentes (abaixo). Fica evidente que, sobre os continentes, o aquecimento
é mais pronunciado.
Esses dados, é claro, são devidamente tratados para
evitar que apareçam erros devido a introdução ou remoção de alguma estação, à
troca de sensores ou devido a efeitos de escala local como a chamada ilha
urbana de calor (algumas estações mais antigas foram instaladas em localidades
originalmente rurais ou periféricas, o que mudou com a expansão de áreas
urbanas, refletindo-se nas medidas de temperatura). Correções são aplicadas
nesses casos para garantir a fidedignidade das medidas.
Ranking de
temperatura dos anos do século XXI em relação aos 132 anos de registro histórico. |
Esse aquecimento é tão pronunciado que, dos 10 anos
mais quentes de todo o registro histórico, somente 1998 não pertence ao século
XXI, como mostrado na Tabela ao lado. De quebra, somente dois anos do século XXI não
estão nessa lista: 2009 e 2011. Ambos foram anos de La Niña (fenômeno marcado pelo resfriamento das águas do setor
central e leste, como um oposto ao El
Niño) e, portanto, deveriam ter apresentado temperaturas abaixo da média,
mas ainda assim ficaram respectivamente em 13° e 11° em 132 anos de registro
histórico! Vale lembrar também que, até Outubro, 2012 vai se posicionando entre
os “top ten”.
Esse aquecimento, evidente na superfície, é também
verificado em toda a troposfera (a camada inferior da atmosfera, que contém a
maior parte de sua massa e na qual ocorrem os fenômenos meteorológicos mais
importantes para a espécie humana e o restante da biosfera, incluindo a
formação de nuvens e precipitação, isto é, chuva, neve, etc.). Como um gás se
expande ao ser aquecido, empurrando para cima um êmbolo ou pistão, o
aquecimento da troposfera tem levado à elevação da tropopausa terrestre (isto
é, a superfície imaginária que separa a troposfera da estratosfera, camada
imediatamente acima), cuja altitude é bem determinada através de
radiossondagens feitas com balões meteorológicos. A Figura abaixo, do lado esquerdo,
mostra como um gás, sujeito a temperaturas maiores, aumenta o seu volume; à
direita, mostra a evolução da posição da tropopausa de 1890 a 1999 segundo reanálise
(equivalente a observações) e segundo dois conjuntos de simulações de modelos
climáticos (uma com, outra sem forçante antrópico). É interessante a influência
das grandes erupções vulcânicas que se destaca em meio a oscilações menores,
mas a tendência de elevação da tropopausa tanto na reanálise quanto na simulação com influência
humana é particularmente marcante a partir dos anos 60.
Acima: evolução da anomalia do nível dos oceanos
desde o
final do século XIX, por reconstruções e marégrafos. Abaixo,
nível do
mar global médio, medido por satélite (Fontes:
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Outros processos bastante evidentes têm ocorrido em
paralelo com e tendo como causa o aquecimento global, sendo um deles a elevação
do nível dos oceanos que, como a quase totalidade dos líquidos, se dilatam
quando sua temperatura cresce. A Figura ao lado mostra a elevação do nível do mar desde o final do século XIX até o
final do século XX, período em que os oceanos subiram em cerca de 20 cm
(acima). Abaixo, a elevação do nível dos oceanos nos últimos 20 anos, período
em que ela tem se acelerado (chegando a 3,1 mm por ano). Em ambos os casos,
cores distintas indicam fontes diferentes de dados.
Área do Oceano Ártico coberta por gelo. Fonte: http://nsidc.org/arcticseaicenews/ |
Igualmente significativa tem sido a redução das
geleiras e do gelo marinho no Ártico. 2012 ficará marcado pelo ano em que pela
primeira vez desde que vem sendo medida a partir do final dos anos 70, a área
do Oceano Ártico coberta por pelo menos 15% de gelo ficou reduzida a menos de 4
milhões de quilômetros quadrados. A Figura ao lado, do National Snow and Ice Data Center (NSIDC, EUA), não deixa dúvidas
de que, em comparação com as condições médias ao final do século XX (linha preta,
contornada por uma faixa cinza indicativa de dois desvios-padrão) e até mesmo com o recorde
anterior (2007, linha verde tracejada), o que ocorreu em setembro deste ano
(linha azul) foi uma anomalia. A área coberta por gelo neste instante em que
escrevo é praticamente a metade do que costumava ser nesta mesma época do ano
há meros 30, 20, 12 anos. É 10% menor do que o valor já impressionante de 5
anos atrás!
É preciso que se diga que não no caso do gelo
marinho, mas o derretimento do gelo continental implica em uma contribuição
substancial para acelerar a elevação do nível dos oceanos.
Como veremos em textos seguintes, esse múltiplos sintomas “febris” que
enumeramos (aumento da temperatura da superfície, aumento da temperatura da
troposfera com elevação da altitude da tropopausa, aumento do nível dos oceanos
e redução do gelo) estão todos conectados a uma única causa.
Excelente texto amigo.
ResponderExcluirOlha, é bom evitar dizer que não há mais margens de erro. Toda medida, por melhor que ela seja, possui margem de erro. Eu não confio nesses dados, muito menos vindos de estações meteorológicas localizadas e com dados "tratados", comparando uma época moderna com uma época onde nem sequer tinham bóias meteorológicas nos oceanos. Quanto ao Ártico, 40 anos de medidas por satélite é muito pouco. Tem que analisar outros fatores, como ciclo solar, PDO, oscilação do Ártico e o pouco falado ciclo lunar de 19 anos. Abraço!
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