segunda-feira, 10 de outubro de 2016

Política energética nos EUA: Clima em Perigo

EUA: canalha negacionista defensor do carvão versus candidata
que aceita a Ciência do Clima mas mantém pesados compromis-
sos com a indústria fóssil, especialmente do gás natural. E aí?
No próximo dia 08 de novembro, a população dos EUA irá às urnas, tendo duas candidaturas com chances reais de vitória: o republicano Donald Trump e a democrata Hillary Clinton, que derrotou, num processo bastante questionável, a pré-candidatura de Bernie Sanders, que tinha um conjunto de propostas bastante adequadas para o enfrentamento das mudanças climáticas.

A conjuntura em que se dá a disputa presidencial é crítica para o clima global, pois embora o Acordo de Paris seja claramente insuficiente para a solução da crise climática (o que foi exaustivamente demonstrado em nosso blog em uma série de artigos), o país o ratificou, juntamente com a China. Embora as mudanças climáticas estejam ficando praticamente de fora dos debates, a questão energética entrou como um dos tópicos do debate realizado agora há pouco. Infelizmente, o que o debate revelou nesse quesito é que temos muitos motivos para nos preocuparmos qualquer que seja o desfecho das eleições.


TRUMP É UM DESASTRE CLIMÁTICO AMBULANTE

Trump é, além de um negacionista climático, xenófobo, islamofóbico, misógino e racista. Mas só por sua aversão à ciência, obscurantismo e ignorância, já deveria ser inteiramente rechaçado. Embora tenha negado ter afirmado algo do tipo no debate anterior, Trump publicou em sua conta no twitter, há alguns anos, a pérola "o conceito do aquecimento global foi criado pelos e para os chineses com o objetivo de tornar a indústria dos EUA não-competitiva".

Trump, no twitter, demonstrando não haver limites para a
ignorância e a desonestidade.
Hoje, coerente com esse velho tweet, Donald "Calamidade Global" Trump defendeu o setor de energias fósseis, acusando a EPA (Agência de Proteção Ambiental) de ser "muito restritiva", criticando a gestão de Obama pela "perda de empregos e competitividade" e repetindo sua verborréia sobre a China, dizendo que "os chineses estão despejando toneladas de aço nos EUA", deixando a siderurgia estadunidense para trás. Chegou ao ponto de repetir o mito do "carvão limpo" afirmando que "o carvão vai durar 1000 anos" e que "temos encontrado enorme riqueza debaixo dos nossos pés".

HILLARY CLINTON RECUA ATÉ MESMO EM RELAÇÃO ÀS MEDIDAS DE OBAMA

Por sua vez, Hillary "Mal Menor" Clinton, embora se saído bem no quesito de provocar o adversário (disse que "os chineses despejam toneladas de aço nos EUA que são comprados pelas empresas de construção de Trump") não conseguiu esconder seus compromissos com a indústria de combustíveis fósseis. Fez questão de afirmar o gás natural como "ponte" para as energias renováveis, em outras palavras, defendendo sobrevida ao setor de termelétricas desde que com um combustível fóssil supostamente menos poluente.

O gás natural pode ser visto como um "mal menor" ou como
"ponte" ou "transição" para um matriz limpa? As evidências
apontam no sentido contrário.
Acontece que, como mostramos em outro momento, o gás natural não é uma ponte, senão uma ponte ao desastre. Quando falamos da insuficiência das propostas e medidas de Obama, mostramos, em primeiro lugar, que a redução prevista nas emissões de CO2 com a estratégia de incentivo ao gás natural em detrimento do carvão termina sendo pequena, bem menor do que o necessário. Em segundo lugar, mostramos que especialmente se tratando de gás não convencional, particularmente o gás de folhelho extraído via fracking, corremos o risco não apenas de não reduzirmos emissões mas, em virtude do aumento das emissões fugitivas e por conta do elevado potencial de aquecimento global (GWP) do metano, não só não mitigarmos nada, como chegarmos até mesmo a resultados piores para o clima. Em artigo recente, mostramos que usando os dados de GWP, atualizados conforme o 5º relatório do IPCC, o gás de fracking pode resultar num efeito climático comparável ao do carvão a longo prazo (escala de 100 anos) e várias vezes maior a curto prazo (escala de cinco anos).

A SAÍDA É O ENFRENTAMENTO ORGANIZADO COM A INDÚSTRIA FÓSSIL

Uma série de protestos levou ao engavetamento do projeto do
oleoduto de Keystone XL. Trump promete ressuscitá-lo.
Trump é uma ameaça explícita a toda e qualquer conquista mínima em vários aspectos não apenas em termos de política ambiental e energética, mas de direitos humanos, serviços de saúde, etc. Ele prometeu à Transcanada que reabriria o debate de implantação do oleoduto de Keystone (um empreendimento cujo objetivo é levar o óleo mais sujo do planeta, obtido das areias betuminosas de Alberta no Canadá, até as refinarias do Texas, nos EUA) e chega ao cúmulo de falar em cancelamento do Acordo de Paris! Sua chegada à presidência dos EUA é um risco mortal a qualquer esperança de solução da crise climática.

Às vésperas da COP21 em Paris, com a mobilização mundial
pelo clima e em Maio deste ano, na campanha BreakFree2016
(Liberte-se) o movimento climático tem ensaiado importantes
intervenções. É possível que no potencial crescimento delas
resida, de fato, nossa esperança em deter o caos climático. 
Acontece que Clinton não chega a ser radicalmente melhor. O Greenpeace, por exemplo, rastreou os vínculos de Hillary com a indústria fóssil e concluiu que nada menos do que 65 lobistas ligados ao setor contribuíram com sua campanha presidencial. Daí, embora a candidata democrata não passe perto do negacionismo climático e do explícito entusiasmo fóssil de Donald Trump, é certo que seus compromissos são muito mais fortes com grandes empresários interessados em manter elevadas emissões de CO2 para mover seus negócios do que com o clima, o ambiente e a maioria da população, especialmente os mais vulneráveis às mudanças climáticas.

Alguma dúvida de que, como bem coloca Naomi Klein, somente a resistência popular é capaz de fazer a diferença e oferecer esperança de que haja avanços no país que, embora tenha sido recentemente superado pela China nas emissões anuais, ainda é o maior emissor histórico e portanto o maior responsável pelas alterações no clima?

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Copo "meio cheio" não salva uma casa em chamas

Alok Sharma, presidente da COP26, teve de conter as lágrimas no anúncio do texto final da Conferência, com recuo em tópicos essenciais "...

Mais populares este mês